Ele gostava muito de anedotas, a bem dizer era mesmo viciado em anedotas, consumias em quantidades apreciáveis, sabia muitas, contava algumas nem mal nem bem dava para entreter os amigos quanto baste. Mas acontece que as anedotas começaram a escassear, já não circulam por aí como andavam dantes, toda a gente contava a sua laracha, "já sabes a ultima?", "contaram-me agora ali uma do caneco". Já não se ouve nada disso, raramente aparecem piadas novas, já não voam, já não andam por aí.
Perante esta situação, vendo-se na eminência de morrer de tédio e tristeza, após longo estudo e profunda merditação, ele resolveu pôr as mãos à obra e começou a inventar as suas próprias anedotas. Umas mais toscas outras mais subtis, mais ridiculas ou mais profundas, lá foi conseguindo animar os seus dias e dar umas gargalhadas genuinamente regeneradoras.
Passou então a inventar as piadas, para de seguida se as contar e depois ria-se à bandeira despregada. Era frequente vê-lo desatar a rir desalmadamente sem razão nenhuma aparente, até houve muita boa gente que começou a interrogar-se sobre a sua saúde mental. Os amigos que já sabiam da história riam-se, esperavam alguns segundos, um minuto ou mais por vezes, que ele se acalmasse e contasse a anedota e riam-se outra vez.
Ele foi assim apurando a tecnica fazendo piadas cada vez com mais graça, mais humor, mais refinadas e sempre da mesma maneira, construía-as com todo o cuidado levando no processo todo o tempo necessário, depois contava-as a si próprio e ria alto e bom som.
Certo dia, enquanto atravessava em passo decidido a praça, ele contou-se toda esta história, contou-se a si próprio como se fosse uma anedota, achou que era tão risível, de morrer a rir mesmo, parou no meio da praça, riu, riu riu sem parar e caiu morto.
Ainda hoje paira entre os amigos como um fantasma, é com um misto de inveja e de temor que todos se interrogam sobre o mistério da ultima anedota... aquela de morrer a rir.
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